Amigos, eu tinha perdido o endereço do meu próprio blog, acreditem. Agora, que consegui reencontrá-lo, vou postar novamente um editorial da revista Brasil Musical que, sempre, infelizmente, me parece atual e matéria de reflexão. Não sei dizer se nosso Theatro, o principal do Brasil, progrediu ou regrediu nesses quase 70 anos que distanciam seu surgimento do nosso momento atual. A grafia dos textos será mantida como na época do lançamento da Brasil Musical.
Pretendo postar outros artigos dessa revista, que foi um marco das artes eruditas na década de 40, no Rio de Janeiro.
O espaço do blog fica aberto para os colegas se manifestarem democraticamente. Todos estão convidados, não só a comentar as matérias, mas a escrevê-las e enviá-las.
Grande abraço.
“Editorial da Brasil Musical, fundada por João Baptista de Campos Mello Filho, no seu primeiro número. O apoio declarado ao Estado Novo de Getúlio Vargas não retira a qualidade da revista, editada em papel couché. Não temos compromisso com a história política do Brasil e nem nos orgulhamos dela. Nosso objeto de preocupação é o artista lírico e o artista em geral. Fato é que, indiscutivelmente, tínhamos políticos mais cultos e preparados intelectualmente. Costumo separar o artista de sua obra, ou começaríamos a censurar Wagner, entre muitos outros.
Somos, no caso, brindados com um registro da década de 40 que se revelou histórico. A Brasil Musical não logrou, como muitas outras publicações, sobreviver, mas cumpriu sua missão de deixar um legado em forma de críticas, reportagens e fotos maravilhosas.”
Eliana Caminada
Foto: Luta Eterna de Igor Schwezoff, 1945. A foto é extraída da revista Brasil Musical.
REVISTA BRASIL MUSICAL
NOVEMBRO DE 1944 NÚMERO 1
DIRETOR RESPONSÁVEL
JOÃO BAPTISTA DE CAMPOS MELLO FILHO
DIRETOR GERENTE
MAURÍCIO SUÉD
NOSSA PLATAFORMA
“Brasil Musical” apareceu sob o signo da batalha. Quer lutar e vai vencer. Lutará porque não ha carreira que se inicie sem dificuldades e tropeços, vencerá porque sua vitória será a conclusão de um esforço honesto, puramente idealista, no sentido de elevar a música no Brasil a um alto grão de divulgação e os seus cultores a uma posição sólida e condigna, de acatamento e respeito.
Compositores e regentes, virtuoses, bailarinos e cantores têm agora o seu “cavaleiro andante” que envidará todos os esforços no sentido de construir para os mesmos, no setor divulgação, um renome à altura dos seus reais méritos, coisa bem pouco conseguida até hoje em nossa terra.
Reivindicará para os artistas nacionais, quando mais não fôr, ao menos o mesmo respeito, a mesma gratidão e assistência carinhosa que os tributados aqui ao artista estrangeiro e, lá fora, a todos os artistas. Despertará no grande público, quase sempre trabalhado por falsos e improvisados orientadores, o interesse pelos nossos artistas, a tolerância inteligente para seus primeiros passos, a alegria por seus progressos, o orgulho por suas vitórias. Os que compõem, os que bailam e os que cantam, apresentando em minutos o produto de anos inteiros de persistência e sacrifícios, têm o direito de fazê-lo num ambiente de simpatia e compreensão, de encorajamento, da parte do grande público e, principalmente, da parte de todos os que também se esforçam em qualquer setor da Arte, – os vitoriosos e os que ainda não estão amadurecidos -, e devem ser incentivados por uma crítica honesta, justa sem ser ofensiva, estimulante e nunca demolidora. Elevando e dignificando o artista brasileiro por todas as formas, divulgando suas realizações e pleiteando o reconhecimento dos seus esforços, “Brasil Musical” tem a seu lado a bôa vontade do grande amigo dos artistas, o Estado Novo, que – para não citar inúmeros feitos anteriores – ainda agora envia em excursão artística oficial para todas as Américas o nosso genial Villa-Lobos, e concede, em ato magnífico de compreensão e reconhecimento, um prêmio em dinheiro ao glorioso Francisco Braga, autor da música do Hino à Bandeira. Um governo que assim age está com o receptor ligado para o que “Brasil Musical” pedir em benefício da música no Brasil. O primeiro pedido feito foi atendido: a concessão do nosso registro. O Major Dutra de Menezes, culto, inteligente e justo, numa época de naturais restrições, não hesitou em abrir exceção, concedendo licença para que fosse publicada esta revista de música. “Brasil Musical” e o grande público leitor que ansiava por seu aparecimento consignam aqui um cordial muito obrigado.
Procurando corresponder a esse honroso tratamento, “Brasil Musical”, em longa distribuição pelo Brasil e Américas, do Chile ao Canadá, vai fazer conhecidos os nossos artistas, pela publicação de suas fotografias e pela descrição dês seus valores. Despertado assim o interesse do país inteiro e do Exterior, lucrará o nosso ambiente musical, viajarão os nossos musicistas do Norte e do Sul para satisfazer a curiosidade dos nossos Estados e dos outros países, e nesse intercâmbio se consagrarão os verdadeiramente eleitos.
Nossos compositores verão suas obras mais divulgadas, e os nossos cantores, bailarinos e virtuoses serão procurados para componentes de elencos e temporadas em formação, podendo viver, como artista profissional, rodeados do conforto necessário e da admiração e respeito que lhes são devidos. Eis o único clima em que poderão vicejar os nossos artistas em embrião; conseguido este, aparecerão mais vocações, grandes afirmações.
Por meio da nossa música e dos nossos artistas seremos mais conhecidos e respeitados. Essa a vitória que “Brasil Musical” se propõe obter, para o que espera contar com o indispensável apoio dos artistas nacionais e a aceitação do grande público que gosta de música. E esse público é todo o Brasil.
Rio, novembro, 1944
João Baptista
diretor
março 11, 2012 às 10:46 am |
Muito bonito e de um texto muito solido e limpo Eliana . Estou gostando ! Gostei da foto excelente que expressa a Drama e Leitura de Texto nos Corpos dos Bailarinos e Artistas que estao dentro da Obra . Parabens esta otimo !
março 11, 2012 às 6:53 pm |
Obrigada Cesar, que bom que você aprovou. Beijos
janeiro 11, 2013 às 6:30 pm |
Que prazer encontrar materia da Brasil Musical e menção ao João Baptista defensor das artes cênicas no Brasil !
agosto 15, 2015 às 6:44 pm |
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